sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Vocais sagrados

O timbre irretocável de Liane Guariente falhou. Talvez somente os que conhecem as gravações do grupo Terra Sonora tenham percebido, mas não havia tantos agudos como ela é capaz. Guariente é uma cantora fabulosa. Consegue atingir níveis altos e a pronúncia de dialetos de diversos grupos de países remotos. Mas naquela noite, algo aconteceu.

Cantava ela o tema Bahatuba, de Sri Lanka.Algumas ousadias foram poupadas. Daniel Farah, que a tem acompanhado no vocal, preenchia os espaços. Ela sorria, cabisbaixa, parecia sentir falta de ar. Que não fosse Edith Piaf. Plínio Silva, fundador do grupo, observava. No intervalo entre uma união de tema e outra (o show estava estruturado na apresentação de duas músicas de países diferentes, por vez), Plínio deu um tempo a Liane. Ela descansou a voz, tomou água, respirou fundo, enquanto ele entretinha o público contando uma história que parecia séria. Era uma piada sobre a origem do nome Macedônia, tema que seria apresentado em seguida.

E Liane ressurgiu. Sua voz vinha do mais profundo sentimento ao cantar a Seresta, de José Eduardo Gramani, tema do Brasil. O choro dos instrumentos acompanhava a dramaticidade daquela peça. A qualidade foi deslumbrante. E os aplausos foram quase um agradecimento, um alívio. Tudo estava bem.

A graça musical, quase sagrada, foi dada por Daniel Farah executando a técnica bifônica de Tuva no tema Beezhinden. Dani -- que até bem pouco tempo atrás era um dos meninos malucos do Universo em Verso Livre, com sua percussão instigante -- consegue obter duas fonias distintas ao mesmo tempo. Difícil explicar. Terra Sonora não precisa de palavras, além daquelas acompanhadas de cítaras, tambores, violões, flautas, violinos e instrumentos tradicionais de países que não fazem parte do Conselho de Segurança da ONU.

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